Bem-vindo! Já há algum tempo senti de aprender mais sobre as abelhas, como se manifestam, como constroem o que necessitam, como se organizam. Então, este é um espaço para aprender e compatilhar, através da busca de informações e do desenvolvimento da própria observação. Outros temas: harmonia, natureza, plantas, cura, terapias e outras afinidades.

sábado, 4 de setembro de 2010

Abelhas Indígenas - Reportagem

Fonte: site http://eptv.globo.com/emissoras
Terra da Gente - Liana John




Hora das indígenas

Sem ferrão e com um mel valorizado, as espécies brasileiras conquistam mais criadores. Aumenta chance de sobrevivência.

Uma mudança na legislação brasileira pode, a um tempo, ampliar significativamente a escala de produção do mel de abelhas nativas e favorecer a conservação de espécies ameaçadas pela competição com a abelha européia africanizada. A nova regra foi sugerida e defendida pelo ambientalista e professor titular de Ecologia do Instituto de Biociências da Universidade de São Paulo, Paulo Nogueira-Neto, uma das maiores autoridades do país nos estudos da vida e criação das abelhas indígenas sem ferrão.



Desde agosto de 2004, essas abelhas podem ser comercializadas em território brasileiro entre criadores registrados no Instituto Brasileiro de Meio Ambiente e Recursos Naturais Renováveis (Ibama). A restrição anterior a esta comercialização, baseada na proibição de venda de fauna brasileira, dificultava a criação comercial, conferindo grande vantagem à Apis mellifera, a espécie trazida da Europa em 1839 pelo Padre Antônio Carneiro, que se espalhou pelos ecossistemas brasileiros e passou a competir com as abelhas indígenas.

“Ainda falta regulamentar o registro do mel para que o produto passe a estar sujeito à inspeção federal e deixe de ser considerado apenas artesanal, ganhando escala, o primeiro passo na direção das exportações”, observa Nogueira-Neto. O especialista lembra que o mel de abelhas indígenas obtém um preço de mercado bem mais elevado do que o comum, podendo chegar a R$120,00 o quilo, caso do mel de uruçu-do-nordeste (Melipona escutellaris). Ele acredita numa boa penetração no mercado europeu e até propõe a adoção do nome iramel ou uiramel para designar a origem indígena.

Já existem produções comerciais com alguma escala nas regiões Norte e Nordeste. Em Boa Vista do Ramos, município próximo de Manaus, no estado do Amazonas, um produtor espera colher este ano algo em torno de 3 toneladas de mel das abelhas jupará preta (Melípona compressipes) e jupará amarela (M. seminigra). E, em Pernambuco, outro produtor mantém pelo menos 500 colméias uruçu-do-nordeste.



É verdade que a produtividade das abelhas indígenas é bem menor do que a das abelhas européias. Elas têm outra maneira de construir as células para suas crias e não produzem favos, mas depositam o mel em pequenos potes, feitos de cera, que dão mais trabalho para colher. Em compensação, seu mel tem concentrações superiores de uma substância chamada inibina, produzida pela enzima glucoseoxidase, que tem propriedades antibióticas.

Pode ser considerado medicinal, portanto, uma qualidade popularmente conhecida há muito tempo – os indígenas brasileiros já usavam o mel como remédio antes da chegada dos europeus (e das abelhas européias) - mas que precisou de alguns testes de laboratório para ser cientificamente reconhecida.

Os testes foram feitos com bacilos patogênicos, isto é, causadores de doenças. Entre eles, o Bacillus antbracis, o mesmo antraz dos ataques terroristas nos Estados Unidos, cujos esporos foram eliminados pelo mel num prazo de 24 horas. E o mel das abelhas indígenas provou uma eficiência maior do que o mel comum na ação contra as bactérias Escherichia coli, Salmonella spp, Pseudomonas aeruginosa e Streptococcus, conforme relata Nogueira-Neto, devido ao seu pH mais baixo (mais ácido) do que o do mel comum. O mel indígena tem outras propriedades medicinais, divulgadas popularmente, mas ainda sem comprovação, caso do uso como colírio ou cicatrizante de feridas e queimaduras.



E é preciso alertar os eventuais usuários sobre os hábitos anti-higiênicos de algumas espécies de abelhas indígenas, cujo mel pode conter alto índice de coliformes fecais. É o caso da mandaçaia (Melípona quadrifasciata) e da irapuá ou arapuá (Trigona spinipes). Elas usam fezes de animais para calafetar as frestas de seus ninhos ou para marcar o território, na entrada das colméias. “A melhor garantia de que o mel não está contaminado é sua procedência e a forma como é tratado, por isso é preciso regulamentar a comercialização e estabelecer padrões de colheita, pasteurização e acondicionamento”, acrescenta Nogueira Neto. “Enquanto não há regulamentação, entre as abelhas indígenas, recomendo sempre o mel de jataí (Tetragonisca angustula), que é a espécie mais higiênica”.

Mesmo assim, o mel deve ser pasteurizado. Mais líquido e menos doce (mais ácido) do que o mel comum, o produto das abelhas indígenas pode fermentar com alguma facilidade. Enquanto o mel comum tem de 16 a 20% de água, o mel indígena tem mais de 30%. A pasteurização pode ser feita artesanalmente, em banho maria, tomando-se certos cuidados, sobretudo o de verificar a temperatura com um termômetro de laticínio (72oC durante 15 segundos), mexer sempre para distribuir o calor de maneira uniforme e não deixar o mel ferver, porque as altas temperaturas eliminam a enzima produtora de inibina, o antibiótico natural.



As vantagens da criação e conservação das abelhas indígenas não se restringem ao mel. Nativas e bem adaptadas aos ecossistemas brasileiros, elas têm um papel importantíssimo na polinização das plantas. Existem espécies de orquídeas e bromélias polinizadas exclusivamente por abelhas da tribo euglossini, que geralmente apresentam cores metálicas, tendendo para o verde ou roxo.

Há também flores grandes e de formato diferenciado - como o maracujá (Passiflora edulis) - que chegam a ser visitadas pelas abelhas européias, mas não são polinizadas, porque estas não alcançam a parte feminina da flor como as mamangavas (tribo bombini), as polonizadoras naturais, bem maiores do que a Apis mellifera.

“O problema é que as abelhas européias são muito ativas nas primeiras horas do dia e visitam rapidamente as flores disponíveis, enquanto as abelhas indígenas tendem a distribuir a coleta de néctar e pólen ao longo do dia”, explica Ivan Sazima, da Zoologia da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp). “Num local onde existam os dois tipos de abelhas, as indígenas tendem a ‘chegar atrasadas’ às flores, visitando-as quando já não há pólen disponível e, portanto, deixando de cumprir a função polinizadora, que as européias também não cumprem porque não são do tamanho certo”.

As abelhas européias já são eficientes na polinização de algumas plantas de borda, como são chamadas as espécies que crescem nas zonas de mata mais aberta, no limite com culturas ou áreas alteradas pelo homem. O exemplo mais evidente é o das jitiranas, trepadeiras que se sobrepõem à copa de outras árvores, atrapalhando sua fotossíntese.

Assim, o fato de existirem abelhas européias africanizadas, numa região de florestas fragmentadas, acaba por interferir na dinâmica natural da flora. E florestas fragmentadas não faltam em toda a região de domínio da Mata Atlântica, justamente onde também estão as abelhas ‘invasoras’.

Para Paulo Nogueira Neto, depois de um período de retração, por excesso de competição com as abelhas européias, a população das espécies indígenas está voltando a crescer, ocupando áreas mais internas dos fragmentos florestais, onde o excesso de sombra limita a Apis mellifera. “O fato de as abelhas indígenas produzirem bem em área de floresta abre a possibilidade de se ter uma atividade econômica em muitas regiões do país, mantendo a mata em pé, sem derrubadas”, diz.

Os enxames naturais ainda podem ser favorecidos com a disponibilização de locais para construção das colméias, como as caixas artificiais especialmente desenhadas para estas abelhas por Nogueira-Neto, menores do que as de abelhas européias e quadradas. Os ocos de árvores velhas, anteriormente usados por estas espécies, hoje são mais raros, seja porque foram retirados para uso como lenha ou porque tendem a cair com o vento, quando a floresta é fragmentada.

“E não podemos esquecer a maior vantagem das abelhas indígenas, que é o fato de não terem ferrão”, conclui Nogueira-Neto. “Elas podem ser criadas muito perto de casa, sem oferecer risco aos homens ou aos animais domésticos”.

As indígenas e suas tribos

A classificação das abelhas é um pouco diversa da dos animais vertebrados e inclui a divisão em subfamílias e tribos. A família Apidae divide-se em: metálicas, verdes ou arroxeadas.

Apíneos – No Brasil representada apenas pela Apis melifera, a abelha européia ou africanizada, introduzida no país em 1839 pelo Padre Antonio Carneiro. Ele trouxe 100colônias do Porto, em Portugal, das quais apenas 7 teriam sobrevivido à travessia do oceano.

Meliponíneos – Abelhas indígenas sem ferrão que produzem mel

Bombíneos – Mamangavas grandes, peludas, às vezes totalmente pretas, às vezes pretas e amarelas. Polinizam o maracujá (Passiflora edulis)

Euglossíneos – Também chamadas abelhas das orquídeas. Polinizam orquídeas e bromélias e, em geral, são de cores metálicas, verdes ou arroxeadas.



A diferença entre vespas e abelhas

Para quem não é muito familiarizado com o mundo dos insetos pode parecer difícil distinguir vespas, abelhas, marimbondos e outros tantos nomes com que são chamados esses invertebrados de asas transparentes e corpo semelhante ao das formigas. De fato, todas pertencem à Ordem Himenoptera – que também inclui as formigas – e as diferenças entre algumas espécies podem ser muito sutis, coisa para especialistas. Mas, pelo comportamento ou tipo de moradia, é possível pelo menos separar abelhas e vespas.

Só as abelhas produzem mel e fazem células de cera, seja para abrigar as crias e/ou para estocar alimento. Essas construções das abelhas normalmente são internas, feitas em ocos de árvores, fendas de rochas ou caixas artificiais. As casas de vespas, ao contrário, são externas, de um material semelhante ao papelão, constituído de fibras vegetais e saliva. Os formatos variam muito, das bem desenhadas casas de cabas – uma das vespas mais temidas da Amazônia, de picada muito dolorida – a pequenas células penduradas nos telhados, dos marimbondos comuns. Marimbondos, aliás, são vespas crescidas, só uma variação no modo de chamar insetos da mesma categoria.



As abelhas são herbívoras, só comem vegetais e preferem pólen e néctar colhido nas flores, razão pela qual são polinizadoras por excelência. As vespas são carnívoras, embora eventualmente também se alimentem de frutos, de seiva ou cheguem a visitar algumas flores. As abelhas enxameiam, as vespas, não. A maioria das abelhas tem o corpo sólido, em alguns casos peludo, enquanto as vespas são mais delgadas, de cintura fina e bem marcada.

A posição das asas também é diferente: as abelhas estão sempre com as asas em pé, mas as vespas sabem dobrá-las longitudinalmente, parecendo mais ‘assentadas’. Finalmente, para quem for perseguido por espécies com ferrão, é melhor que sejam abelhas, que picam uma única vez e perdem o ferrão na picada, pois as vespas podem picar diversas vezes.

Mel Comum (APIS MELLIFERA)
16 a 20% de água
Gosto tende a ser mais doce
Cristaliza mais fácil, em dias frios
A produtividade é maior
É produzido em áreas abertas, ensolaradas
É pasteurizado a 63oC

MEL INDÍGENA (MELIPONÍNEOS)
Mais de 30% de água
Gosto tende a ser mais ácido
Pode fermentar se a colheita não for higiênica
Contém alta concentração de inibina, enzima antibiótica e antibacteriana
É produzido em áreas abertas, sombreadas e de floresta
Não agüenta temperaturas superiores a 59oC

Fonte: site http://eptv.globo.com/emissoras
Terra da Gente - Liana John